12.2.15

O que corre em Udaipur




No ano em que a minha filha nasceu, não choveu no Rajastão, o lago Pichola secou, os agricultores passaram fome, os turistas desertaram, os peixes morreram. Podia-se ir à ilha do palácio de Verão do Marahana de Rickshaw, o preço do hotel de cinco estrelas baixou, mas ninguém estava interessado. A culpa não foi dela. Pelo menos, não dessa vez.
Este podia ser o inicio de um conto épico fantastico, mas é apenas a realidade. Não encontraremos aqui motivos para excitações. Outros assuntos, ocupam Udaipur nos dias que vivemos.
Esta semana casa-se na cidade de Udaipur, a filha de um homem de negócios indiano. Um homem muito importante, dizem-me todos. Um homem rico, penso eu, tento mudar de conversa e encolho os ombros. O que me têm a dizer acerca dos bigodes dos rajputs ?
Todos os hotéis de cinco estrelas estão cheios, ele pagou tudo. sete mil rupias por pessoa, são quase mil, diz-me o senhor que se ocupa do templo de Vishnu. 20 mil rupias diz-me o empregado de mesa, por um quarto apenas.  How much do you pay for a night here, mam ? Durante 4 dias o palácio da cidade é enfeitado com grande tendas rosa fuschia e laranja. Finjo que não me afecta tanto dinheiro. Desdenho, talvez queira comprar. Não estou acostumada, de onde venho os ricos costumam ter algum pudor. Ou talvez ande simplesmente atenta a outras vidas. Digo que é estranho escolher-se um lugar tão especial, tão antigo, e depois encher-se tudo de cenários e cores garridas. Que se fosse eu tinha escolhido uma orquestra ao vivo em vez de ter um sound system para acompanhar os dançarinos, velas em vez de lasers. Mas dizem-me que há outra festa noutra ilha, que, se calhar, ali vai estar a orquestra. E as velas, se insisto nisso. It's a very rich businessman, you know ? Very important. Que uma vez veio a Shakira dançar num casamento. You know Shakira ? You know the belly dance ? Very good, ya ?
Ya.
Quando passeamos assistimos aos ensaios, vão recrear um filme de bollywood para os convidados, No corredor que vai dar aos aposentos da avo do Marahana, mulher muito devota ao deus Khrisna, o meu filho espreita pela janela com dois guardas. Estamos todos de fora, a minha filha ficou aborrecida por não ter sido convidada. Eu também. deve-se comer bem nestas ocasiões.
Em Udaipur estão habituados a ver passar muito dinheiro. Os Maharanas, não pecam pela descrição. O guia diz-me que o povo do Rajastão é também muito rico, quando começo com as minhas perguntas revolucionarias, de onde vinha o dinheiro para se construir palacios assim? Penso no que me responderia um guia no palacio de Versalhes. E concluo que o guia não deve sair muitas vezes do palacio. Mas provavelmente é apenas um grande hipocrita à sua maneira. Muitas vezes temos de o ser.
Não vai haver barcos para a ilha, por causa do casamento. Da porcaria do casamento de milhares de milhões. Os actores de bollywood chegaram de helicoptero. Barcos antigos passeam os convidados. Como se fosse uma procissão. Como se a noiva fosse uma virgem. A Virgem.
A noite, por causa das tosses, jantamos num palacio, num palacete mais exactamente, fingimos levar uma vida de Raja, mas não temos ideia. Não podemos ter.
Para dizer a verdade a vista é lindissima, mesmo sem milhões no bolso, E esta não é uma fraca compensação, acreditem no que vos digo.

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