6.11.13

Eastbourne ou um prelúdio depois da introdução

 

Não se tem falado aqui sobre as viagens que se faz, tal como se tem evitado falado do que é essencial. Sempre difícil falar do que nos faz mover, ocupa-se então o écran com  o acessório e a vida corre na mesma. Na mesma : rápida, demasiado rápida, a voar.

Não se fala de sexo, por exemplo. Optou-se por falar na televisão, nas conversas no Bairro Alto, nos telefonemas - numa ilusão de libertinagem e rebeldia - de desilusões, de posições e, claro, de acessórios, mas fala-se muito pouco de sexo. Porque o essencial do sexo encontra-se algures aqui dentro. Desejo, tripas e restantes orgãos. Como falar de sexo, sem cair ao lado, na anatomia ?
Não se fala de amor, aos filhos, ao pai dos filhos, ao namorado, ao proprio, mas antes da falta que se sente, da saudade, de adjectivos, fala-se até dos cabelos, mas não se fala de amor.
Ou então é-se ridículo. Ou então é-se poeta. Mas nem só os poetas amam. Nem os ridiculos.

Não se fala de viagens.
Fala-se de guias, de logística, mostra-se fotos, fala-se de preparativos, às vezes até de dinheiro, fala-se do que se quer fazer, do que não se fez, lamenta-se, mas não se fala da viagem. Quase como se fosse a mesma coisa sentar-se e ver tudo na televisão. Mais facil, mais barato.
Fala-se melhor de viagens através da literatura, da musica, do que das viagens através da vida. E vida pode ser a literatura, a musica. Sim. Pois. Mas isso já seria desconversar. E neste post, como neste blogue, o que se pretende é uma boa, e tanto quanto possivel, honesta conversa.

Andarei, então, às voltas com este relato desta viagem o quanto me deixarem, pois não sei ainda como descalçar esta bota e não cair nos mesmos erros que apontei.

Como preludio depois do tempo, esta viagem teve Eastbourne e os seus pontões.
Tínhamos estado antes em viagem.
Antes de partir, estivemos a sonhar com ela.
Na biblioteca a arrecadar todos os livros infantis sobre Inglaterra, a Rainha e a BBC.
A desenhar tudo o que queríamos ver. Viver ?
Quando acordamos às 5 da manhã, a horas de correr para apanhar o ferry, com as crianças a espalhar os seus conhecimentos de inglês - no fundo, o essencial : Hello / I love you / bye-bye e umas quantas banalidades, cores, animais, apresentações e assim.
Tínhamos ouvido as historias de dr. Seuss no autoradio, enquanto nos aproximavamos da fronteira. Tínhamos mesmo visitado ou palmilhado Rye. Essa cidade, que tal como tantas outras, nos foi descrita como a mais bela de Inglaterra. Afinal de contas, porque não ?

E depois, Eastbourne.
O mar de Debussy e o final de um certo capitulo desta viagem. Nuvens cor de rosa, um mar agitado, um frio do caraças, as pedras da praia dentro do carro para recordação e o meu coup de blues inglês, o primeiro e o ultimo, enquanto me afastava para tirar estas fotos.
Eles ficaram a andar de trotinette, a falar de geologia, do mar, e eu a sentir o mesmo que senti quando li - vivi? - On Chesil Beach. Por muito mais a Oeste que estivesse Chesil Beach, foi em Eastbourne que a senti, esta estranheza de final de dia. A mesma estranheza que sinto nas urbanizadas praias de Cherbourg ou de Deauville, ou mesmo da Costa da Caparica perto da cidade, ao final do dia, na época baixa.
Mistérios das viagens.

E se de salvação precisava, salvação encontrei uns kilometros mais tarde. E não foram Eles. Que,portanto, teriam para tal poderes. Os que amo. E nem sequer foi a raposa que passou à nossa frente, a atravessar a estrada na passadeira.  "Fox" gritou-se no banco de tras. Orgulho e Surpresa.

No proximo post falarei de uma salvação.
De uma salvação brilhante, devo acrescentar.

14 comentários:

  1. Vou então buscar mais uma chávena (enquanto tento perceber por que é que também não ando a dar o devido espaço à viagem e ao amor na minha vida que, caramba, é mesmo só uma...).

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    1. Ja te disse no passado : quem não confere o devido valor à morte, não pode dar o valor devido à vida.
      Para a proxima vez que estiver em Portugal, marcamos um encontro num cemitério. (Depois vamos para outros sitios, mas apenas depois de termos a certeza que vamos dar ao vinho, que vamos beber, a importância que merece). Vai ser gotico.
      Traz a Melissinha, sinto que vai apreciar.

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  2. Todos tentamos e à nossa maneira. Há quem seja mais brilhante nas palavras e textos e há quem só o consiga fazer através de esquemas e imagens. Se um blogue anda quieto é porque a vida anda agitada, mas se por outro lado anda agitado também pode ser porque temos tantas coisas importantes por dizer A quem importa? talvez e só a nós mesmos...*
    (aguardo pelo próximo capítulo, que este realmente está meio que embrulhado)

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    1. Muito embrulhado, muito embrulhado. Ainda tentei dar-lhe a volta mas ficou pior. Melhores posts virão, é ter fé.

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  3. Espero que esse post seja dentro de cinco minutos, porque não vou aguentar esperar muito tempo.

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  4. Fiquei com vontade de escrever o que nunca escrevi sobre a minha viagem a Londres este ano. Para além de Londres ser sempre Londres foi a primeira viagem que fiz com marido, filhos e mãe que não sabe uma palavra em Inglês mas que ganhou mais umas vidas por rever o filho emigrado. Até eu deixei escapar uma lagrimita na hora da despedida e os miúdos gozaram comigo. Raios!

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    1. :) é mesmo muito estranho escrever sobre viagens, sobretudo depois de as termos feito, e durante ainda é mais, e antes pode dar azar. Mas é uma questão de se tentar, no minimo ficamos a escrever para o boneco e a suspirar.

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    2. Só voltei aqui hoje, depois de ler o relato Londres. Parabéns pela escrita e partilha. É tão bom ver os rebentos a ganhar mundo não é?

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    3. Sim, é das melhores coisas desta aventura de se ser mãe. E o relato da tua viagem a Londres ?

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