26.9.17

Salada afro-emocional

A precisar de repouso da vida real, estava ontem numa livraria a escolher ficções alheias.
O real cansa, por vezes, todos sabem.
Mas a inspiração chegou-me num telefonema. Larguei os três livros na prateleira e corri para fora da estante, para dentro de outras vidas.
A vontade do dia a seguir veio de um relato de uma amiga das suas recentes férias em Moçambique.
Nasci em Lourenço Marques, que rapidamente se transformou em Maputo, em geopolítica comentada nos telejornais, em relatos edénicos da minha família na terra para sempre perdida.
Viajei por outros lados e evito, há quarenta anos, confrontar a terra onde nasci realmente e onde fui construída teoricamente. Eu também sou aquela terra, mesmo que aquela terra não seja eu.

Conhecidos, familiares, amigos retornados e moçambicanos chegam-me das suas peregrinações às origens com histórias desencantadas. A realidade não lhes convém. Ali nada há a procurar, garantem-me. E fui esquecendo o início da minha vida.
E esquecendo-me que eu não sou os outros.

Foram estas outras férias sem história em África, sem expectativas, de uma turista sem passados africanos ou coloniais que me abriram novamente esta parte do meu futuro. Ao mesmo tempo que se vai desmascando a narrativa encomendada.
A minha história, pessoal e intransmissível vai ter que ser contada por mim a mim mesma. Porque não pode ser doutra forma.
Não vou procurar o passado dos meus pais, não vou simular nostalgias, vou conhecer a minha versão dos factos.

"Verdade e conciliação" 10:17. E viver também esta parte da vida.


“Portugal meteu a escravatura, o colonialismo e o racismo debaixo da cama” from Público on Vimeo.

15 comentários:

  1. Tenho pensado muito em ti. Desde que lá estive, em Fevereiro, que prometi um relato que parece-me que não chegará ao blog. Não fui sozinha, o que me fez passar dias nas vidas dessas pessoas com quem fui, que não quero comprometer. Para não contar o que vi, mais vale estar calada. Mas aqui posso dizer-te, baixinho, que muitos portugueses ainda se sentem colonos e acreditam que aquela terra lhes deve tudo. Não gostei de muito do que vi. Mas gostei muito dos Moçambicanos. Muito. E acho que devias ir lá experimentar aqueles abraços maravilhosos.

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