19.9.12

Surpresa


Quando estava de esperanças pela primeira vez ainda acreditava no pai natal, no sono profundo dos recém nascidos e nos cremes anti-estrias. Não necessariamente por esta ordem. Preocupada com a disneylização do meu estado, então actual, uma amiga ofereceu-me um dos best sellers da altura, o Un heureux événement de Eliette Abecassis. Com uma prosa cínica mas realista, descobri que a minha barriga iria crescer até não me deixar dormir, que a minha pouca resistência à dor poderia dar-me algum trabalho para dar à luz, que o azul podia ser uma cor negra se dita em inglês e associada a bébés e que, pelo menos deveria dar graças a algum tipo de deus, por ter um namorado que parecia perceber ao que ia.
Alguns meses depois, entendi que mesmo que não se entre em clichés de homens-que-são-pais-mas-que-pensam-que-são-filhos, o peso da maternidade não se media apenas nos quilos a mais que a minha balança teimava em anunciar.
Aguentado o primeiro impacto, decidimo-nos por um duplo. On the rocks. E o burn out esteve-nos a rondar durante largos meses. Ter filhos seguidos, adeptos da tortura da ausência de sono, num país sem babysitters familiares à porta, pode dar cabo de um elefante, imaginem o que nos fez a nós.
Ninguém nos tinha dito que podia ser tão difícil.
Sobrevivemos.
O que também toda a gente se esqueceu de dizer é que havia mais rounds. Eles cresceram, segundo o plano inicial. Agora dormem à noite, as birras diminuíram e vão à *escola*. Denoto alguma motivação para a razoabilidade nesta casa. Pelo menos a nível de décibeis, o que já é muito. Pode mesmo ser quase tudo.
O que nunca ninguém me disse é que eu, que tanto me queixei da minha carreira interrompida, que tanto tive medo pelo meu sonho de barbie executiva abandonado, ía gostar de estar em casa. Desta liberdade. A cuidar dos meus. De mim. Como nem sequer a minha avó alguma vez fez. Andei varias gerações atrás, para descobrir que podia haver um futuro diferente.
Por muito politicamente incorrecto que possa parecer, eu não me estou dar mal a ser inútil para a sociedade de consumo. Ninguém me disse que as prioridades podiam mudar tanto. Avisaram-me que íam mudar. Mas nunca ninguém me disse que tanto. Olho-me no espelho e não me reconheço.E isso não é necessariamente mau. Mas isto, claro, tem dias.

A culpa deste texto e desta foto é da Marilyn Monroe. Mesmo que não tenha sido perdida nem achada.

11 comentários:

  1. Depois de anos de vida em liberdade, mudei tudo e ainda não sei se para melhor. Estou há três dias em liberdade condicional e está a saber-me tão bem, não sei se decida fugir!

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  2. então espera até o teu marido dizer que também quer essa boa vida, e que em nome da igualdade quem vai trabalhar fora de casa nos próximos tempos és tu... ;-)
    (a sério: já ouvi homens dizer que preferiam estar em casa, como as suas mulheres, a ter de ir trabalhar) (isto a inveja é uma coisa muito feia)

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  3. Foge ! Foge ! Eu ando a fugir há pelo menos 1 ano e olha que por vezes quase sou apanhada. Agora, devo confessar-te que daqui de fora, pelo menos daqui deste lado, o que tu fazes parece-me bastante apetecível. Olha, que bem discutido, ainda trocávamos de vida.

    O meu "marido" ficaria muito melhor em casa do que eu, quer-me parecer, pelos feitios e tarefas a fazer. E gostava mesmo muito de lhe proporcionar isso, olha, até pode ser que seja essa a motivação que me vai safar/lixar.

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  4. Não é mau não senhora e os filhos ganham imenso com isso!

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  5. Acredito e espero que sim. Garantido, porém, é o que eu estou a ganhar.

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  6. Nada é para sempre, não é?
    Podes experimentar, e ver que tal.

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  7. Parece-me que essa é mesmo a via a seguir, de facto.

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