6.9.12

Do umbigo até à lua

Ganhei o hábito de dizer que sou emigrante. Porque vivo em França e sou de origem portuguesa, a brincadeira tende a pegar. Pura banha de cobra. Nunca me senti coisa nenhuma. Nem portuguesa, nem francesa. Acrescento, que nem terrestre me sinto, na maior parte das vezes.

Mas sinto Lisboa, Paris, Almada e Vannes como minhas. Mesmo que esta última tenha sido emprestada - é minha e não faço tensões de a devolver. Moçambique faz parte de mim, por tudo o que aqui colocaram dentro, e não foi pouco.

Todos dizem mal da terra e das suas gentes. "Todos" é, evidentemente, um exagero. A maior parte dos lisboetas dizem-se peneirentos, os parisienses do Oeste gozam com o snobismo dos do Este e os do Este desdenham os do Oeste, os almadenses dizem mal da sua carteira, e os de Vannes dizem mal dos de Lorient. Os de Vannes são, em muitas destas coisas próprias à humanidade, a excepção à regra - para todos os efeitos, são sempre eles os melhores. Dos moçambicanos pouco sei, à parte o que me dizem os retornados, Mia Couto e a mulata do beijo, que é por acaso loira.

Fui-me habituando a estas histórias de auto-maldizer, sempre tropeçando no que é irreal nas ideias colectivas. Por cada indivíduo que conheço, esbate-se um pouco mais um estereótipo. Pelo que nunca vou compreender porque tenho lido tanto mal dos portugueses em tão pouco tempo. Nos jornais de grande tiragem, nas redes sociais, nas piadas do meu primo. Os portugueses.

Uma senhora no metro de Lisboa contava à amiga que os parques em Paris eram lindos de morrer, sempre arranjados e lamentava a degradação dos parques de Lisboa. São uns selvagens. Os portugueses.
Como explicar à senhora que os portugueses e os franceses, não são perdidos nem achados ? Que as grades à volta do parque, os muitos jardineiros e guardas, e o senhor do apito que nos faz sair às 19h porque tem que fechar, são por muito mais ?

Dêem as mãos e olhem para São Bento.

2 comentários:

  1. O problema é terem sido os portugueses a escolher os de São Bento. É só por isso que os portugueses me irritam, muitas vezes. De resto, somos um espectáculo.

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  2. Entendo, entendo. Mas também não se pode dizer que, naquela altura da cruzinha, estivessem com carradas de alternativas maravilhosas. Podia ter sido menos pior, podia. Mas tiveram alguma desculpa, ficaram desorientados, pronto.
    Mas isto vai, isto vai !
    Em vez de acabar o texto com olhem para São Bento, devia ter escrito avancem para São Bento. Invadam São Bento. Esvaziem São Bento.
    Lá está, os brandos costumes a lixarem-nos...

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