Ainda estou aqui mesmo que não saiba para onde irei a seguir. Vim de uma história fantasiosa de um país mítico que nunca existiu e para onde nunca se poderá voltar. O Moçambique que me foi contado é mais inacessível que Narnia. Cresci a ouvir contar histórias de crianças pela boca de adultos que nunca cresceram, porque o caminho lhes foi interrompido por uma guerra que chegou de um lugar longínquo, de um lugar real. Cresci e continuei a fugir da realidade dos outros. Não me interessam visões curtas, práticas e eficazes, onde um unicórnio é uma start up que vale um bilião de euros. Muitos quilómetros de distância.
Em 92 tive um sonho, Paris das lumières e um lugar mítico que nos transmitiu um professor que tinha sido Pica minas na guerra colonial. A minha vida parece que dá muitas voltas, mas anda sempre tudo à volta do mesmo. Nas férias da páscoa fomos todos dentro de dois autocarros à pinha de entusiasmo e hormonas. O sonho tinha pernas para andar e em 2004 comecei a vivê-lo por conta de um francês que conheci em Praga. Em Paris soube o que era o sonho da maternidade, do amor e da cultura que nos entra em cada esquina. E depois quis mais e maior, a felicidade também pode dar-nos ganância. Mesmo quando não é uma ambição de poder ou materialista. Querer viver mais, sempre e mais profundo. Quis então dar a volta ao mundo. Quis ir para a estrada, sem pensar para onde, sem ter onde chegar. E fui sentir e viver. Seguiram-se os atentados em Paris quando pensámos ter voltado para a rotina parisiense, terá sido um mau sonho? Fugi e voltei para Lisboa. Voltei para o pé da minha vida anterior, e ultimamente para Maputo, mas desta vez para a terra real, histórias de adultos contados por crianças.
Voltar ao café Zambi, na baía de Maputo, onde me cortei na mão quando tinha um ano, saber de onde vinha aquela cicatriz. o que fica em nós dos sítios onde vivemos?
Ainda estou aqui. Mas nunca no meu lugar. Always go a long Way / Give the Day some meaning.
Saber para onde ir para finalmente chegar.
Este texto foi escrito em resposta ao desafio do colectivo Largo. Esta semana, Mariana também está aqui.
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