21.2.25

Teias de aranha


A minha casa está sempre um caos ou não seria minha. Neste tipo de organização livre é onde me sinto bem e desde que saí de casa dos meus pais nunca mais vivi nunca casa arrumada, excepto quando recebo visitas, ou quando vou de férias. 

Só convido a minha casa quem é igualmente desarrumado, agora é esse o meu critério. Houve um tempo em que convidava quem eu gostava, mas o trabalho que dá arrumar tudo, para que fique apresentável não compensa. Não gosto assim tanto de ninguém a ponto de passar vários dias a arrumar, esfregar, organizar, lavar e, pior, a tentar que o trabalho feito não se desmanche antes da data combinada. Não que tenha nada contra casas arrumadas, mas não são é para mim, o problema não são elas, sou eu. 

Tenho amigos que mesmo que nunca tenham sido convidados a minha casa, me convidam às suas. Gosto de pensar que lhes dou uma outra coisa em troca desta hospitalidade. Gosto de pensar que tem a ver com a minha personalidade, o meu sentido de humor corrosivo, ou o meu savoir vivre. Tento sempre não me esquecer de levar alcóol ou drogas para completar a minha presença. As casas deles não me incomodam muito com a sua arrumação imaculada, sinto-me praticamente bem e sempre que posso, aceito o convite, mas sentia-me melhor se estivessem um pouco desarrumadas, tenho que confessar. Não gosto de pensar que se deram a um trabalho, que não vou valorizar, para me acolher. E gosto ainda menos de pensar que, amigos meus, que eu prezo, passem muito tempo com actividades sem interesse ou, pior, estão tão domesticados que nunca atiram os sapatos ao calhas quando chegam a casa. Que, quando ninguém os está a julgar, mesmo assim têm gestos comedidos ou automáticos e, sem dar por isso, colocam os sapatos direitinhos no sítio que está predisposto para os sapatos. Que tenham sítios predispostos para os sapatos que entram e saiem várias vezes por dia.

Na desarrumação catastrófica que é sempre a minha casa, estranhamente quase nunca há teias de aranha. Sempre ensinei os meus filhos a não destruirem as teias. Porque gosto de aranhas, em primeiro lugar, mas também porque apanham outros insectos de que não gosto e porque ouvi dizer que atraem dinheiro. Por isso, sei que não são eles que as fazem desaparecer. A realidade é que há tanto movimento aqui dentro que as aranhas devem fugir. Também não reparo que haja assim tanto pó em cima dos móveis. mas isso é provavelmente porque não reparo nessas coisas, Reparar em pó, questiono-me sobre p tipo de pessoa que, com tanta maravilha e horror à sua volta para reparar, decide reparar em pó.

Na minha casa há confusão e, por isso, as teias de aranhas são poucas e por isso, talvez, raramente tenho muito dinheiro. O meu filho joga à bola na sala, apesar das minhas cerâmicas e dos meus gritos, a minha filha, quando vem viver connosco - já tenho uma filha que vive sozinha e que, para meu orgulho, já desarruma o seu próprio espaço - atira a roupa e o que tem à mão para cima do sofá ou da cama ou da gata, o vento que estes projecteis fazem, também deve contribuir para a ausência de teias de aranha. Eu danço todos os dias como se ninguém estivesse a olhar, a gata corre e atira-se para criaturas que nunca vimos, as teias não singram.

Não tenho condições para falar sobre teias de aranhas, só quero que saibam que gosto muito delas e que que seriam muito bem vindas neste feliz habitat de biodiversidade em convulsão.


Outras teias de aranha publicadas hoje no colectivo :

pela Maria João

pela Rita Dantas

pela Calita Fonseca

pela Joana

pela Mariana

(em actualização)

1 comentário:

  1. Convida-me para ir a tua casa. Aposto que sou mais desarrumada que tu!

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