15.5.14

Meu estranho mês de Abril. Parte 3

Comprei os cravos, mas não foi fácil.
Uma pessoa vive longe e pensa se eu estivesse lá, como seria tudo tão diferente !
Vamos ao engano.
Olhe que os cravos são muito caros hoje e ninguém quer pagar o que eles pedem,
Olhe, vá ao Continente !
Olhem, não quis olhar.
Acabei por esperar atrás de um senhor enamorado, que pedia um arranjo especial para a sua rosa vermelha escarlate.
Florista de bairro, muito plástico, muito spray.
Os cravos estavam escondidos.
Censurados ?
Agora finalmente eram meus.

Contei a historia aos meus filhos, mas não foi evidente.
Uma pessoa vive sozinha e pensa se eu estivesse acompanhada, como seria tudo tão diferente !
Cada um tinha a sua versão dos factos.
Onde estavas tu no dia 25 de Abril de 1974 ?
Huum ?
Ficaram os miúdos esclarecidos e no final houve um desenho.
Uma senhora oferecia cravos aos militares de pistola.
A revolução em Portugal.
Une histoire de fleuristes.

Quis ir passear na avenida, dizer palavras de ordem, gritar se fosse caso disso.
Uma pessoa comemora rodeada de franceses e pensa se eu estivesse lá, isso é que era fazer e acontecer ! 

Venham cá almoçar, venham cá lanchar, é feriado, bolas !
E fomos e comemos.
E se fossemos à avenida? tentava eu, cada vez com menos entusiasmo.
Sim, sim, mais uma fatia de tarde de maçã ?

Começo a perceber porque é que a maior parte das revoluções no mundo vieram do estrangeiro, de exilados, de emigrados, ou das casernas onde a família e os amigos não podem entrar.
Nem as tartes de maçã. Nem os bolos tricolores.

Nem sequer havia sol. Podia ter feito um esforço.
Ah, a força que eu tenho quando estou longe !

2 comentários:

  1. Será que distância amplia as expectativas ou esta geração não sabe comemorar?

    Foi pena não teres visto isto (http://www.agendalx.pt/evento/depois-da-revolucao#.U3Xl1CgYooM), que foi uma comemoração à altura.

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  2. Esta geração sabe comemorar, que eu ja assisti a comemorações celebradas como se fossem feitas por gente grande, eu é que, claramente, não me soube organizar.

    A distância distorce um bocado a realidade. Com tudo o que leio nos jornais, chego sempre com uma imagem diferente da realidade que encontro quando aterro em Lisboa.
    Depois também podiamos alargar a conversa e dizer que todas as realidades estão condenadas a ser distorcidas. Mas isso daria pano para mangas e com o calor que faz, quem precisa de tapar os braços ?

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