10.7.12

Numa outra dimensão qualquer


Eu tenho uma espécie de clone, mas ninguém sabe disso. Não fiz de propósito, mas ao longo destes 10 anos de vida noutro país, uma pessoa encarna a Carla R. que não emigrou. Não é ficção cientifica e nem sequer é um clone muito fiável, mas foi o que se pode arranjar. O meu clone com muitas aspas é uma ex-colega minha que tinha, mais coisa, menos coisa, a mesma situação profissional, familiar, emocional que eu e a mesma loucura não muito controlada. Uma loucura que nem sempre derrapava para o mesmo lado que a minha. Mas que derrapava, e para mim é o suficiente para estabelecer um paralelo.
Uma forma de "e se ..." materializado num outro ser humano. Ainda por cima num corpo giro.
Partimos do ano de 2002 com vidas parecidas e 10 anos depois quando falamos, é como se eu falasse comigo se não tivesse ido na conversa de um francês. Nunca tive medo de roçar a esquizofrenia.
Não imaginam o jeito que me dá telefonar-lhe quando me sinto muito perdida e já não sei quem sou. Allô ? Olha, não vais acreditar mas não faço ideia de onde estou, sim outra vez, podes-me dar as minhas coordenadas actuais, por favor ?
Com todo o rigor científico dos horóscopos da Maria, se eu não tivesse emigrado seria na mesma feliz com o meu namorado, teria o mesmo número de filhos, saíria muito mais vezes à noite, mas muito mais, tinha uma aparência muito mais cuidada, não teria blogue, nem facebook, teria uma empregada, mas neste preciso momento teria acabado de enviar para a administração uma carta de adeus. Por causa da crise e da degradação das condições de trabalho. Por mais voltas que tivesse dado, a um qualquer momento da minha vida, teria parado de trabalhar.
Este é o fim de um ciclo.
Nunca mais vou poder culpar a naturalidade de outrém, ou um espírito demasiado aventureiro para os meus males existenciais. Os meus argumentos escasseiam. Sinto o pânico a apoderar-se do vizinho do lado, que é o mais próximo que o deixo aproximar. Nada de confianças.

3 comentários:

  1. tantas vezes já pensei também como seria a minha vida (e se é que eu teria coragem para isso) se eu mandasse os chefinhos às favas e ficasse simplesmente a gozar o soleil e a ver crecer um bando de criancinhas ranhosas.

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  2. Não tenho a certeza que tenha a ver com coragem.
    Loucura, tem mais a ver com loucura.

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  3. Conheço a sensação... estranhamente sim...

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