Recomendo contenção homeopática com estas questões das salvações. Uma boa salvação, por norma, transforma-se numa próxima perdição. Não vislumbro uma excepção à regra, e caso o faça, será isso mesmo, a excepção.
Há uma frase muito verdadeira em que tropeço dia sim, dia sim "last night a DJ save my life", a música rende, a música eleva, a música salva.
Salva-me.
Lembro-me de estar muito perdida em noite de choro e desespero, quando as minhas crias eram bebés. Raramente tomava banho, dormir uma noite era uma miragem de contos de Sherazade, ler um livro era algo que nem me passava pela cabeça. A pessoa que era, tal como a tinha conhecido tinha morrido, tinha sido enterrada, o seu caixão profanado e ninguém lhe depositava flores no 1 de Novembro.. Estava cansada, vivia pela sobrevivência, não raciocinava, as alegrias da maternidade estavam lá, mas escondidas. Um primo meu, ao saber do meu estado em França, enviou-me uma música dos Vampire Weekend. Foi o início de um tratamento que me fez vir à tona, respirar e perceber que o sol ainda brilhava. Todos os dias enviava-me uma música nova. Quando vim a Portugal de férias, já era outra e fomos juntos a um concerto, talvez dos Alt J. Ele ainda não tinha sido pai e não compreendeu o meu efusivo discurso de gratidão.
Passaram-se anos e nunca mais deixei de procurar música nova que me salvasse a vida. mesmo quando estava salva.
Bem sei que há música salvadora que já me acompanha desde os meus anos de adolescência, mas música nova que me toca profundamente é algo que me faz o sangue correr mais rápido, mais vivo, mais novo.
Depois veio a perdição. Talvez esta fórmula não se aplique a todos, nem todo o ser humano é obsessivo e compulsivo, ouvi dizer que há exemplares da nossa espécie mais equilibrados - não padeço desse mal. Tombo e caio, desiqulibro-me e oriento-me e assim vou avançando mais ou menos a par com o calendário. A minha paixão pela música já me tirou o sono, impediu de ir a encontros, não me deixou concentrar, atirou-me a vontade de pintar, de escrever, para depois
Há momentos em que não sei se sou uma mulher ou apenas os seus ouvidos. A música apoderou-se de mim. Sou toda eu música. Sou só música muitos dias.
Parece bom. Mas isto também é um sinal S.O.S. no dancefloor, tenho dias que quero a minha vida de volta.
Mentira. Ou talvez não.
Todas as sextas-feiras um grupo de escritoras publica um texto sobre o mesmo tema, a hora é aleatória, a assiduidade é a possível.
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